A arquitetura bioclimática é a arquitetura que se beneficia das condições climáticas locais com o objetivo de proporcionar conforto ambiental com pouco ou nenhum consumo energético.
O principal objetivo da arquitetura bioclimática é projetar se beneficiando das condições climáticas locais e promover edificações com conforto ambiental. Ao focar nessas características é possível desenvolver um design muito mais sustentável e eficiente.
Quando se fala em “aproveitar o clima local”, um bom exemplo disso é conhecer as características dos ventos da região, avaliando fatores como intensidade ou direção. A partir desses estudos e simulações é possível posicionar aberturas e janelas de maneira a proporcionar trocas de ar com estratégias de ventilação natural .
Quando falamos em maior eficiência energética, isso significa que, com a devida atenção a questões como a orientação ou uso de elementos sombreadores em fachadas por exemplo, a edificação terá menor necessidade do uso de aparelhos condicionadores de ar para estabelecer o conforto térmico e desta forma haverá menor consumo de energia (maior eficiência energética).
Segundo dados do ENERGY RESEARCH GROUP (ERG, 1999), as edificações usam pelo menos 50% de toda a energia utilizada em nosso planeta. A maior parte dessa quantia refere-se a equipamentos de aquecimento, resfriamento e iluminação. (labbe.ufsc.br)
O termo conhecido como “arquitetura bioclimática” foi criado em meados da década de 1960, porém podemos dizer que sua aplicação prática ocorreu muito antes disso. Os homens das cavernas, por exemplo, utilizavam o formato das rochas e cavernas para se abrigar e se proteger da radiação solar direta no verão. Dentro dessas rochas, a inércia térmica absorvia o calor interno, mantendo o espaço com temperaturas mais agradáveis.
Com o passar do tempo, as construções se tornaram mais sofisticadas e alguns abrigos puderam ser criados para melhorar ainda mais as condições de conforto, em relação à proteção solar no verão e a manutenção do calor no inverno gerado por fontes ativas como o fogo.
Foshan Meisha Bilingual School/ Aube Conception
Ao longo dos anos as nossas construções se tornaram mais sofisticadas e as envoltórias alcançaram um nível maior de isolamento térmico e maior estanqueidade.
Dessa forma, boa parte desse calor que é “capturado” pela envoltória fica “preso” dentro do ambiente, prejudicando os níveis de conforto térmico. No entanto, para se “livrar” desse calor armazenado, bastava abrir janelas permitindo assim a ventilação natural. O problema é que com o passar dos anos, nossas construções foram ficando maiores e as plantas muito mais profundas, dificultando assim o adequado funcionamento do sistema de ventilação natural.
Com a expansão das áreas urbanas, também passamos a ter sérios problemas com os ruídos e a poluição. Isso nos obrigou a “fechar” as construções. E assim, com a grande geração de calor ou carga térmica interna e uma grande quantidade de pessoas dentro das edificações, principalmente nos escritórios, as construções começaram a usar sistemas ativos e mecanizados para esfriar os ambientes.
Atualmente, uma série de máquinas são utilizadas para extrair esse calor que não consegue sair por conta das envoltórias fechadas, por consequência disso, o consumo de energia se torna elevado. Com o aumento das mudanças climáticas e o aquecimento das temperaturas, esse tema está alcançando maiores espaços na arquitetura em em outras áreas.
Na arquitetura bioclimática, as soluções adotadas levam em consideração as características climáticas locais para melhorar as condições de conforto, e por consequência tornam a construção mais sustentável. Esse tipo de arquitetura denota o uso inteligente de recursos naturais e o aproveitamento das condições do clima, impactando positivamente no desempenho e na eficiência energética do edifício.
A arquitetura com foco na sustentabilidade abrange questões como o impacto ao meio ambiente, energia dos materiais e uso de água e energia.
Carabanchel Building Phase II/ RLA
A primeira fase do projeto Carabanchel Building Phase foi desenvolvida com sistemas construtivos industrializados e buscando a máxima eficiência energética. Na segunda fase, foram incluídas 25 habitações em um novo bloco, levando em conta critérios bioclimáticos, eficiência energética, sustentabilidade e gestão e eficiência hídrica.
A orientação da edificação foi selecionada para conseguir a máxima luz solar, pois diminui o consumo e potencializa a eficiência energética.
Com o aumento da preocupação com o clima global e ações de sustentabilidade, aos poucos a adoção de estratégias bioclimáticas vem sendo resgatadas.
A arquitetura bioclimática é a retomada destes princípios de observação do clima e o aproveitamento das condições climáticas locais, utilizando materiais adequados para cada superfície e sistemas de sombreamento. No Brasil, país de clima tropical, isso é ainda mais importante.
Summers Office Building in Buenos Aires
Para evitar o acúmulo de calor, deve haver o correto posicionamento de janelas para ventilação natural e assim permitir que haja essa fluidez do ar.
Em muitos casos, a utilização de vegetação para melhorar as condições climáticas também proporciona o sombreamento para as fachadas. O sombreamento é essencial principalmente em casos em que é necessário manter as janelas fechadas boa parte do tempo por conta do ruído ou da poluição.
O bom desempenho de fachadas e coberturas dessa envoltória é fundamental para que as cargas térmicas não sejam elevadas ao extremo.
Arquitetura bioclimática é justamente o correto uso dos materiais, dos sistemas de sombreamento e dos sistemas de ventilação natural.
O uso de ferramentas que permitam análise de desempenho e desenvolvimento de simulações considerando as especificações do projeto são essenciais na arquitetura bioclimática. As simulações computacionais envolvem cálculos complexos e exigem um grande número de dados. Portanto, nesse contexto, o uso das ferramentas e suas análises são imprescindíveis na hora de selecionar as decisões corretas para o projeto.
Conhecer aspectos como propriedades térmicas dos materiais construtivos, conceitos de transferência do calor, carta solar e entender bem o contexto da região faz com que o arquiteto em suas decisões utilize das condições locais para o benefício do projeto. A adoção de estratégias passivas como ventilação e iluminação natural podem e devem estar de acordo aspectos estéticos da arquitetura.
Santa Madrona. 62 social dwellings/ Pich- Aguilera Architects
No projeto “Santa Madrona”, as moradias foram projetadas seguindo estratégias da arquitetura bioclimática, buscando eficiência energética através de sistemas de produção de energias renováveis. Todos os apartamentos têm ventilação cruzada natural operáveis manualmente ou de forma automatizada, possuem amplas varandas para a proteção solar, as divisões foram distribuídas para aproveitar a máxima iluminação natural. Além disso, há isolamento, tanto na madeira como nas paredes exteriores e aproveitamento da radiação solar para aquecimento da água.
É importante destacar que questões bioclimáticas não desconsideram características do projeto arquitetônico, mas caminham lado a lado de forma integrada, resultando assim na qualidade do ambiente construído e proporcionando maior conforto aos usuários e habitantes.
Luz Natural
A radiação solar pode ser utilizada para produção de energia elétrica através da inserção de painéis solares. Dependendo do tamanho do sistema, pode haver uma redução importante no consumo de energia, podendo ser utilizado para o funcionamento de equipamentos de aquecimento/resfriamento e outras finalidades.
A luz natural afeta de forma positiva o humor, o bem-estar, o conforto e a saúde dos seres humanos. Quando bem utilizada, essa técnica passiva proporciona eficiência energética ao diminuir a necessidade de utilização de luz artificial durante o dia.
Porém, atingir os níveis corretos de iluminação requer estudos, análises e simulações. Em excesso, a luz natural pode causar sérios problemas de ofuscamento, além de prejudicar o conforto térmico. Por isso, as aberturas devem ser corretamente posicionadas e contar com o auxílio de sistemas de sombramento como por exemplo terraços externos, brises, beirais, entre outros.
Leia o artigo sobre luz natural e sustentabilidade na arquitetura.
O Telhado verde é solução sustentável de cobertura formada por uma camada de vegetação natural. Essa cobertura diminui as cargas térmicas e é capaz de proporcionar um melhor conforto térmico e eficiência energética nas construções. Por diminuir a necessidade de equipamentos condicionadores de ar, o consumo de energia é reduzido. Clique aqui e saiba mais sobre o telhado verde.
Isolamento Térmico
O isolamento será capaz de proporcionar conforto e trará um clima agradável mesmo em temperaturas mais extremas (regiões muito quentes ou excessivamente frias).
Por exemplo, ao adicionar um forro simples de gesso ou madeira na cobertura, o U-value é reduzido em mais da metade, o que significa que o nível de isolamento térmico mais do que dobra.
Além disso, materiais de alvenaria como bloco cerâmico ou bloco de concreto possuem diferentes níveis de desempenho em termos de isolamento.
Escolha de Materiais
Conhecendo as características dos materiais construtivos, é possível selecionar aqueles de melhor desempenho térmico.
É necessário ter muita atenção na escolha dos materiais que irão compor os sistemas de pisos, fachadas, coberturas. Para isso é necessário conhecer conceitos como a “transmitância global”. Esse número representa a quantidade de calor que passa de fora para dentro (no caso de períodos quentes) quando há diferença de temperatura entre o interior e o exterior da edificação. O calor tende a passar da face mais quente pra mais fria. Quanto menor a transmitância (U-value), maior é o nível de isolamento térmico de um sistema construtivo.
Além disso é importante olhar para os materiais que causam menos impactos ambientais.
Leia também: Desempenho de materiais construtivos.
Cores de Fachadas
Edifícios com fachadas de baixa absortância (cores claras) refletem mais radiação solar, proporcionando reduzido ganho de calor nos ambientes. Isso é positivo para o verão, porém limita o o aquecimento passivo no inverno em regiões de clima mais frio, já que reduz também os ganhos térmicos quando são necessários para a edificação.
Para equilibrar e fazer as escolhas corretas é necessário realizar a análise do edifício considerando orientação solar, áreas envidraçadas e materiais. Todos esses dados, somados a simulações computacionais termodinâmicas é fundamental para uma boa seleção de cores de fachada com o objetivo de controlar o conforto térmico.
Sistemas de Janelas
Existem alguns tipos de vidros, que proporcionam melhor desempenho térmico. Os vidros duplos (ou insulados), principalmente aqueles com tecnologia de baixa emissividade (low-e), podem atingir excelentes níveis de controle térmico, com boa transmissão de luz natural e reduzida refletividade (quando comparados a um laminado de mesmo desempenho) e portanto menor aspecto espelhado. Outro benefício é que os vidros duplos auxiliam também no desempenho acústico de fachadas.
Podem ser uma boa opção para algumas regiões de nosso país, principalmente em regiões de clima predominantemente quentes, reduzindo os ganhos de calor por condução. No entanto, é importante lembrar que vidros de alto desempenho (duplos ou não) compõem apenas uma parte da solução. Nenhuma tecnologia supera o controle solar que brises e elementos sombreadores são capazes de proporcionar.
Sombreamento
Sombrear as fachadas com elementos construtivos é essencial para o conforto térmico dentro dos edifícios. Há também a possibilidade de criar sombras com vegetação e o plantio de árvores ao redor da construção. As plantas também melhoram a umidade do ar ao evaporar água na atmosfera, além de reduzir a temperatura. Estudos apontam que há uma redução de até 5 graus Celsius em regiões bem arborizadas, quando comparado a locais com pouca ou nenhuma vegetação.
A grande vantagem é que, dependendo da espécie, as árvores podem derrubar maior quantidade de folhas no inverno, permitindo assim maior iluminação e aquecimento em dias frios, ao mesmo tempo em que proporciona sombreamento e diminuição de temperatura no verão.
O brise-soleil é um exemplo de elemento sombreador que bloqueia parte da radiação incidente. O cobogó é outro exemplo de material que permite a entrada de luz indireta e ventilação natural. Clique aqui e saiba mais sobre os brises.
La Cartuja Community Residence for Students
Ventilação Natural
*Digital Process : Kahn@Pixsolution.co.nz/ ANZ Raranga at Sylvia Park /Architectus
A ventilação natural é uma estratégia importante na arquitetura bioclimática. Com a troca de ar (retirada e fornecimento do ar externo para o ambiente interno) há um aumento da qualidade do ar e melhora nas condições de conforto térmico, além da diminuição no consumo de energia.
A ventilação tem um papel importante na manutenção do conforto térmico nos espaços, existem algumas técnicas que podem ser utilizadas como a ventilação cruzada ou o efeito chaminé. No efeito chaminé o ar frio (mais denso) exerce “pressão” sobre o ar quente, para que ele saia através de saídas de ar dispostas em diferentes níveis no centro do projeto, como torres, exaustores ou coberturas.
Leia também: Benefícios e técnicas de ventilação natural
Orientação Solar
O conhecimento sobre a orientação solar do local e a incidência nos edifícios permite que os arquitetos possam aproveitar as melhores oportunidades e assim proporcionar condições adequadas de conforto. Esse estudo é importante tanto para a concepção da volumetria do edifício, distribuição interna dos ambientes, para a seleção de vidros, brises, materiais e até para a priorização de determinadas cores nas fachadas.
Gestão de Resíduos na Construção
O bom planejamento de projeto tem muito a contribuir com a redução de resíduos de obra. Durante o projeto pode-se pensar na modulação de partes do edifício em função de elementos construtivos disponíveis no mercado, evitando perdas em obra.
Desperdício em obra não é apenas aquilo que enxergamos como dejeto que vai pra caçamba, mas aquilo que fica embutido desnecessariamente nos edifícios.
O adequado dimensionamento das estruturas, evitando quantidades excessivas de concreto e aço, é também estratégico.
Uma vez reduzidas as chances de desperdício durante o projeto, deve-se focar em planejamento de obra através da ativação de equipes especializadas em planejamento e administração de materiais e planejamento de compras. Iniciada a obra, deve-se focar em deslocamento adequado, organização e limpeza do canteiro e armazenamento correto. O último recurso, quando de fato resíduos foram gerados, é pensar em reuso e reciclagem.
Avançados métodos de simulação e análise computacional devem ser utilizadas para embasar as decisões corretas de projeto. É necessário conhecer o contexto local, bem como os conceitos e estratégias de arquitetura bioclimática para a aplicação correta das soluções e assim alcançar o objetivo de projetar uma edificação com desempenho e conforto térmico.
Referências: Aplicação de Conceitos da Arquitetura Bioclimática como exemplo de Eficiência Energética no Clima Quente e Úmido; (Aldomar Pedrini, PhD
PPGAU – UFRN, Sileno Cirne Trindade, MSc, Labcon – UFRN)
Bioclimatic integration into the architectural design.- Alexandra Albuquerque Maciel
Veja o vídeo: